28.8.11

Verdade

Os olhos dele não brilham como a luz do sol.
Seus cabelos não são sedosos. São, na verdade, pouco macios.
Eu nunca reparei em nenhum cheiro em particular que fosse só dele, como um perfume natural. Na verdade, eu estou perfeitamente feliz com o perfume que ele compra.
Não sei dizer, sinceramente, se gostaria de ouvi-lo cantando meu nome. Na verdade, quando ele me chama, eu não presto atenção especial a sua voz, mas ao seu tom.
Eu não amo a maneira como ele me faz sentir todo o tempo. Não amo. Ele muitas vezes me faz sentir insegura, nervosa, inquieta, preocupada, resmungona, mal-humorada. Ele muitas vezes desperta em mim uma solidão sem sentido, um medo sem sentido.
Ele não é perfeito, nem para mim. Se pudesse, eu o faria mais como eu, faria pequenas alterações que o deixassem mais com a minha cara, talvez.

Tudo isso é a verdade. Tudo mais isso:

Os olhos dele brilham como a Lua; é suave, harmoniza.
Seus cabelos me fazem sorrir, eles são adoravelmente errados. Fazem cosquinha na minha unha quando faço carinho.
Gosto de saber que não é um cheiro apenas que me faz lembrar dele; não é o cheiro da pele dele. É o cheiro de pipoca de cinema. É o cheiro de chuva. É o cheiro de brownie queimado. É o cheiro de barbecue com shoyo. É o cheiro de óleo de massagem. É o meu cheiro.
Quero ouvi-lo cantar baixinho, quando acha que eu não estou ouvindo. Não ligo para quando ele simplesmente diz "Bárbara", mas ligo muito para o que os ouvidos não percebem. Importo-me com o que ele diz sem dizer, com o mundo de música que ele me oferece no silêncio de seu olhar.
E, em absoluto, ele me faz sentir tudo. Muito de tudo, muito muito muito, e, ainda, muito pouco. Ele me faz querer ser mais do que cabe em mim, me faz pensar em um monte de besteira e me faz fazer a coisa certa. Me faz sentir sentimentos que eu preferia não conhecer e me faz abrir os olhos para a beleza da imperfeição. Para o valor do perdão, da compreensão, da cumplicidade, da grandeza de se dar amor quando se precisa de amor; oferecer a mão, o braço, o ombro e o pescoço, quando se precisa de colo; voltar e conversar, quando se quer fugir e esquecer. Ele me faz crescer, me completa. Nosso amor é repleto.
Meu amor não é perfeito. Meu amor é real.
Meu amor não tem defeitos; meu amor é real.

27.8.11

Perto

Eu não preciso de você. Não tanto. Não preciso tanto assim de você, não respiro você, não te quero todo minuto, não me importo com seus passos, não procuro. Não quero, não preciso, não ligo, não desligo.

Eu não sou apaixonada por você, não me esforço. Eu não olho, não finjo ver. Eu não quero, não posso. Eu não sou mais como eu costumava ser, não choro, não gosto, não torço, não espero, não desespero, não ouço.

Eu não amo, não rezo, não corro, não quero, não quero, não quero. Não moro mais aqui, não entro pela porta, não disco seu número, não piso nesse chão, não vou nessa direção.
Eu não olho mais para o relógio, não aguardo respostas, não cuido, ignoro meu coração. Eu não estou, não estarei, isso eu não sei, mas é não. Só não.

15.7.11

Problemas

Dividir. Aprendi uma coisa sobre dividir o que é importante para você: tenha cuidado. Quando se divide, é compartilhado mais do que só o gosto por uma música, uma banda especial, uma poesia, um fato, uma mania, um dia chuvoso e nublado, momentos especiais que só você entende a magia, sonhos, pesadelos, desabafos: quando se divide você doa parte da sua memória.
Minha lembrança, que era feita de particularidades minhas. O que me deixava feliz, eu confiei a você. Contei meus segredos, minha intimidade. Revelei meu 'eu' a ti, sem pensar nas consequências.

E quando a pessoa com quem você dividiu te magoa, simplesmente tudo aquilo que significa tanto para você, te traz paz, é transformado em tortura. Hoje eu ouvi The Beatles, porque era a única saída, você nunca gostou muito deles. É só o que resta de mim que não me lembra você. É como uma faca de dois gumes; olho para o céu, hoje está chuvoso, tento sentir de novo a alegria que eu sentia antes. Mas só o que me vem é dor. Dor porque eu preferia que o céu de hoje fosse nosso, e dor, mais ainda, pois sei que ele nunca mais será só meu.

Ao perder você, perdi junto More Than Words, perdi as panquecas, perdi a chuva, perdi a cor azul, perdi Laranja Mecânica, perdi meu anel 13, perdi gatos pretos, perdi minha conexão comigo. Ao quebrar meu coração, você condenou minha memória a ter que se esquecer. Para esquecer você preciso esquecer quem eu era com você, quem eu deixei que você visse, tocasse, amasse.

Quando se divide, se sacrifica, se aposta. Eu fui cega em achar que podia depositar em você todos os meus detalhes, esperando os seus em troca. Espero agora, em vão, que minha dor te comova, que meu silêncio te aproxime. Sinto solidão em você, sinto solidão em mim. Sinto que não tenho para onde fugir, porque todos os meus abrigos têm o seu cheiro, a sua foto, a sua lembrança.

Esse é o problema, o grande problema, de quem ama, de quem se expõe, de quem se permite. Abre-se a porta não só para beijos e carinhos, mas também para um enorme desejo de sofrer uma lobotomia geral. Cabe a mim, eu sei, construir um outro 'eu' que possa conviver com sua memória latente. Arquitetar um novo mundo onde você não seja mais bem vindo. Achar um novo coração, livre, livre de quem éramos.

4.7.11

Achismo

Eu sinto como se não pertencesse a nenhum lugar que eu conheça bem, que eu possa chamar de meu. O que me tem eu não possuo, eu não domino, ou não entendo. E o que eu tenho não se mostra para mim, me faz achar e me perder em achismos. Eu as vezes acho que meus sentimentos vêm do vento, e que, assim, eu pertenço a ele. Mas o vento está onde está o ar; não tem lugar. Outras vezes, penso ser de mim mesma. Como se eu só coubesse aqui dentro, e em qualquer outro meio não fizesse sentido.
Talvez eu simplesmente queira ser simples e não sou. Queira ser especialista em viver e não sou. Queira saber como amar na medida certa, ter medo na medida certa etc, etc etc. Talvez eu queira ser menos do que eu sou.

6.6.11

Mais uma vez

As vezes eu me dou conta de mim e dos meus sentimentos. E, assim, percebo todas as contradições e erros que existem por existir na minha existência: como, em cada respiração, o ar que expiro leva uma parte de mim. Como se, com um olhar, eu pudesse voltar ao antes, sem me dar conta de que meu agora virou um depois num piscar do mesmo olhar. Como eu não acompanho minhas teorias sobre o melhor jeito de lidar com meu jeito, a maneira menos arriscada de correr riscos.

As vezes imagens ilustram o que eu não sei ler: um pequeno e patético redemoinho tentando ser forte, levantando folhinhas do chão e rapidamente se dissolvendo no nada. A nuca coberta por cabelos escuros de alguém que caminha apressado, sem olhar para traz, entrando corredores de pedra. Pessoas comendo em silêncio. O vento frio de madrugada entrando sorrateiro pela janela.

As vezes tenho pesadelos dos quais acordo com sustos quietos, noturnos. Outras vezes, os pesadelos são ferozes e me acordam com sussurros que soam como gritos. Tento sempre entender porque meu cérebro me leva a essas viagens mentais desagradáveis, mas falho, com a cabeça ainda no travesseiro, e torço para simplesmente não sonhar, ou dormir sem perceber.

E todas essas vezes, acontecem muitas e muitas vezes; fazem quem eu sou. E quem pode me explicar como eu posso ser de uma vez por todas?

21.4.11

Bem-te-vi

Um pássaro voou para mim, mostrou como é ser livre, trouxe esperança. Lembra de mim?, ele disse. Então voou para longe.
Eu lembrei dele, o pássaro que morava em mim, aqui no meu coração e no meu pulmão e sei lá mais aonde.
Senti suas asas batendo dentro do meu peito, seu canto ressoando no meu pensamento. Eu era hóspede de suas penas negras. Senti saudade do pássaro, um outro, que saiu pela minha garganta, pelos meus olhos, pelos meus poros, e se pôs a voar sem mim, migrando entorpecido para o sul, ou aonde quer que seja o destino dos sentimentos sentidos.

11.4.11

Eucentrismo

Quase ninguém que me conhece, conhece quem eu sou, o que eu sou. Meu 'quem' se esconde do mundo, sendo 'eu' numa outra língua, acho que só eu sei ler. E, assim, eu me torno a cada segundo um único dó da sinfonia que eu guardo aqui dentro. Eu mantenho um leve sussurro do grito e da música que tem, sustento uma gota de tinta das milhões de cores do meu pensamento. É impossível me ver tridimencional, se você é só um outro, não sei porque, apenas que não dá mesmo. Acontece de vez em quando, no entanto. É estranho ter o irreconheível armazenado; meu 'eu' não se vê a olho nu.

Uma frase.

Tem que ser muito eu mesmo(a), para me aturar.

9.4.11

22:22h

Começou a ventar forte. Um vento esbarrou no vidro do carro. Um cachorro latiu e foi silenciado pelo som das folhas das árvores. Era noite. Uma pessoa saiu de um carro com náuseas. Uma porta bateu em algum lugar longe. Um carro passou lentamente na rua, rente à calçada. O vento empurrava a pessoa, que caminhava apressada segurando (ou segurando-se) aos seus cabelos. Um monte de papel usado formava um mini redemoinho em um canto sujo. Vultos no escuro. Uma pessoa olhou em volta, procurando rostos?, que rostos.. Essa pessoa chegou, enfim, entrou; elevador, corredor, casa. Correu até a janela, abriu -vento - olhou para baixo. Lá estava o carro, acelerando em direção contrária. Aquela pessoa continuou com o vento no rosto e percebeu que perdera o foco, percebeu um arrepio. A rua ruminante era banhada pelo luar doente que modestamente luzia. Uma outra pessoa, em uma outra janela, tapava os olhos com as mãos.

8.4.11

Maresia

Quais são os momentos da minha vida dos quais eu me lembrarei? Queria poder saber quais as memórias que me farão sorrir sozinha, olhando para uma noite aleatória por uma janela. O que me fará ficar séria, séria de tanto querer reviver. Anseio já pelo nome sagrado da minha nostalgia, do meu 'omelete de amoras'. Gosto de pensar que é o cheiro de 'linzer', as flores cor de rosa na rua da colina, onde antes tinha a casa da qual me mudei até hoje não sei porque. Penso que serão os docinhos da Cavé, os passeios perdidos pelas ruas do centro da cidade, o Gabinete Português de Leitura, sempre com meu pai. Sinto as viagens de carro com minha mãe para praias vazias, só com mar e mata atrás, o cheiro de maresia, as comidinhas no quarto de hotel, as aventuras por vilas de pescadores conversando com pessoas cujos nomes não me importa saber. Gosto de imaginar-me velhinha, antes de dormir, sacando meu álbum virtual na minha mente, e vendo as cantorias no carro, meus sonhos quebrados, meus amores espontâneos e imaculados. No canto das dores, vejo a pscina do clube Municipal, onde tomava aulas de natação, sob a luz do luar e a luz da sala de dança logo à frente; meninas de fru-fru treinavam seus 'pliés' e eu olhava e esperava, tão em vão que nem sei como esperar, sonhava trocar meu maio sem graça por um collaint como o da Svetlana. Pessoas que eu perdi, coisas que eu perdi, promessas que eu perdi. Há, sim, um grande prazer em se render ao lugar mágico onde rezide aquela parte de mim que já foi no tempo, aquela parte do tempo que já está em mim. Mesmo doendo, não machuca. Mesmo me roendo de paixão, como poderia sumir, ou algum dia desejar não tê-lo, anseio de ter o passado em minhas mãos. Não excluo o amor pelo futuro e ainda mais pelo presente, mas como é bom passar o dedo pelos cachos dormidos de uma vida vivida. Quem sou eu, aqui com 18 anos, falando de nostalgia?

1.4.11

Síndrome do vagão lotado

Outro dia foi dia - e que dia - de momentos que simplesmente não se entende. Nesse dia eu estava no metrô, lendo sobre o Grande Meaulness, e senti um par de olhos em mim. Senti que era vigiada, levantei a cabeça e esbarrei com um rosto dormente de um homem idoso que me olhava tão firmemente que eu quase levantei. Depois de um segundo de desconforto, aqueles olhos saíram de mim. A partir daí tudo naquele vagão me fitava, e eu fui sufocada pela visão alheia. Sem saber o que fazer, resolvi concentrar-me em minhas mãos, mas então minha nuca foi curvada, mais uma vez, pela presença virtual de um olhar. Procurei, vi retinas, globos oculares, lentes, cores, íris. Senti vontade de sair correndo no abrir de portas seguinte, sem saber qual era a estação. Segui aliviada pela roleta, porta, e estava livre novamente. Os olhares murchavam e caíam das minhas costas, jaziam no chão. Derepente, abri os olhos e percebi que havia adormecido, acordara no ponto final e todos os demais passageiros não estavam mais no vagão. Eu não era olhada por ninguém, tinha certeza, e pude voltar à razão. Caminhei para fora me concentrando no pesadelo que ainda não se despedira da minha mente, e ri de mim mesma. Passei, então, por um espelho e, ao me ver andando, senti uma vontade gritante de correr.

27.3.11

Pio

Minha hora favorita é quando só se ouve, talvez, os pingos que pingam na pia da cozinha. É quando eu me dou conta de que eu e você somos um 'ainda' (o que eu pensei que não poderíamos ser). Ainda que nada mais faça sentido. Ainda que você seja um iludido, eu me sujo de fantasia que só nós podemos ver. Eu sou ainda o que ainda é você. E, assim, somos, nós, dois aindas, que insistem em ser. Essas verdades cotidianas só são apresentadas aqui, entre os pingos caídos, escorrendo pelo encanamento e desaguando não se sabe onde. No silêncio dessa hora surda. E, ainda assim, somos um pio, um assobio bonito como ainda podemos ser.

23.3.11

Já que hoje eu "vi estrelas"

Comecei com Bilac, mas isso não é parnasiano, não, de modo algum. Aqui eu escrevo apenas um bilhete, nada mais que um bilhete, e eu não sei porque. Não sei porque o escrevo, desconheço o que tenho a dizer. Mas essa noite escolhi não ter escolha e apenas descrevo meu sentimento para você, estranho que me lê. Meu sentimento é esse: eu não sei ser. Faz sentido? Não responda. Não quero sequer que esse bilhete faça sentido. Espero que ele não seja meramente lido, pois simplesmente não se encaixa nas coisas que eu faço. Eu sinto como se fosse de outro espaço, como se meu eu fosse imensamente pequeno e minimamente abundante, e se escondesse atrás da casquinha. Da forma de pessoa, minha pessoa se contém e não conta a ninguém. Mas eu conto agora a você, que desconheço, mas que me lê. Isso só porque hoje eu vi as estrelas; preciso me fazer dizer.

14.3.11

Famintos

Olhos de corvo incinerantes, me pegam desprevinida quando acordo para o gole d'água de madrugada. Asas de corvo batem famintas, e fazem um rebuliço selvagem na minha querida, partida, vontade de esquecer. Patas de corvo polidas, buscam, cheias de graça, minha esperança moribunda, de enfim parar de me preocupar com meu magnífico destino, meu pretérito contundente e todas as células do meu corpo. Por que preciso, meu deus, pensar tanto? Ter consciência da gravidade na pele, como penas negras, é, ao menos, normal? Só sei que meu normal é me assombrar com minha própria vida, e ser perseguida pelas infinitas versões de mim mesma que guardo em minha garganta. Eu olho para o corvo de olhos ardentes, asas famintas e patas polidas, e só então enfrento meu medo de jamais esquecer cada detalhe de mim. No minuto seguinte, pisco para meus olhos ardentes, e, paradoxalmente, enfrento meu medo de me perder entre voos vazios de um futuro carente.

13.3.11

Um par de sonhos

Alguns sonhos existem em nós sem a pretenção de se tornarem realidade do lado de fora. Desejos que, sonolentos, as vezes beijam as pálpebras de seu dono , revelando sua essência sem se impor. Alguns sonhos nascem somente para serem sonhados e, assim, não morrem nunca pois jamais serão plenamente realizados. São feitos para serem incompletos de realidade, para que preencham a nossa própria com seu teor utópico. E isso tem tanta beleza, como um paraíso particular privado para onde se pode recorrer nas horas do dia em que se fazem necessários. Uma pausa programada para uma trama já conhecida; os sonhos esquecidos no imaginário da mente, no inventário do coração. Uma sensação que pode ser sentida ao se deparar com uma memória remota encostada no canto do tempo, em portas fechadas, em copos vazios, em pequenos tesouros encontrados pela casa, em marcas na almofada, em receitas de vida mal resolvidas. Pequenos sonhos existem em pequenas coisas do dia a dia, que enriquecem a felicidade com um brilho simplório. Pequenos sonhos são feitos de segredos sagrados protegidos por pálpebras sonolentas que beijam os olhos. Pelo sabor do beijo não dado, eternamente idealizao. Daí se extrai a maior parte das alegrias; do pouco que se é dado, aos tropeços, por um sonhador cançado da realidade na qual se afunda. Pequenas brisas de momentos felizes, são o par de sonhos que calçam os pés que tocam o chão.

28.2.11

Sopro

Eu só presto para o amor, embora meu amor se preste para tudo, até as ínfimas coisas, até a última gota. Anseio mais, desde sempre, a véspera do sopro do bafo da vida que me acorrenta como uma serpente; o momento - enfim - em que me consagrarei aquilo que creio ser, e que se crê em mim existente, presente.
Eu só sirvo para isso. "Isso", que consiste no sonho sem sonho, nas ínfimas coisas, na última gota.

24.2.11

Ser

Você é como uma nuvem que faz chover em mim. Você é como o solista, no violino ou no piano, que dá graça à uma orquestra, é como a palheta de cores que pintam um céu de verão, ou a calmaria serena que se estende nas horas de inverno. Você é uma canção dedicada especialmente para ninguém em especial, você evapora um pouco em tudo o que toca, fácil de absorver. Você é uma folha ao sabor do vento, mornamente levitando no ar de uma tarde. Você é como uma boa notícia vindo, acontecendo, sendo. Você é muito mais que eu jamais posso conter, mas eu te tenho por absoluto em cada sorriso que dou. Você é doçura de quando se acorda só por acordar, quando se abre o coração só para doar, quando se espera pelo luar. De tudo, eu não sei como explicar, mas você é como deveria ser. Você é a metade do inteiro que nunca realmente existiu em mim. Você me faz perceber que sou só um pedacinho. Estranho assim dizer, mas você já me diz tanto, e é exatamente como deveria ser; sem exageros, retoques, fantoches, estoques. Estranhamente, você é como eu, e então eu sou como sempre quis ser e nós juntos somos como eu e você.

13.2.11

Nada faz sentido

Que confusão é o vento, quando ele venta como agora. Sem direção, sem coração. Eu digo, vem, estamos em sintonia. Eu sou ar também, digo em voz alta. Eu confesso ao vento que venta em mim. No meu pulmão, é uma ventania dançante. No meu coração, é uma brisa, mas transborda. Fecho os olhos e sinto o vento no meu rosto. Imagino uma cortina leve balançando. Imagino cabelos esvoaçantes, olhos molhados, cachecol voando para longe, árvores agitadas. Respiro fundo; mais ar, mais combustível. Imagino paredes caindo, folhas sequestradas, braços abertos, meu rosto. Seu rosto. Ele encosta em mim, vindo com o vento, ele me toca na face. Torno, então, a abrir os olhos, e expiro a calmaria que se seguirá. Eu olho para o ar em movimento e percebo o fugaz momento em que não acho sentido, não me faço sentido e exatamente por isso não acho desperdício tamanho rebuliço que é causado pelo vento. Minha mente traga seu rosto, meus olhos observam a ventania em suas milhões de cores, meu pulmão enfim respira, e meu coração... meu coração humildemente me dá a mão. Seja lá o que aconteça, eu e ele sabemos que nunca faremos sentido perante o vento. Ambos apenas sentiremos.

10.2.11

Luar

Chorou de tanto amar.
Amou de tanto sonhar.
Sonhou de tanto esperar.

Nadou, remou para encontrar,
e gritou, olhou para o mar.

E chorou, pelo sonho de amor
que cansou de esperar.

O porquê absurdo.

Ela perguntou. Ela queria o motivo, mas, sabia, não havia algum. "E eu?", indagou, descobrindo, num susto, que nada era seu.
Sem mais perguntas, ela esperou que o silêncio se consagrasse mudo, e todo o resto se tornasse nulo. Ela aguardou que o tempo tomasse seu rumo, lhe tomasse seu tudo, moldasse um futuro. Ela acalmou por um segundo, para se achar sentada em cima do muro. Fechou os olhos para que continuassem puros, e jurou que jamais tentaria o absurdo de se explicar para o mundo.

1.2.11

Festim

Chove. E chove muito... É engraçado como eu sempre paro pela chuva e para a chuva, observo-a por horas, e não me importo que me molhe na janela. É curioso também, como parece que mais nada pára diante dela, o mundo continua. Ninguém parece perceber a paz que cai do céu.
A chuva tem um poder sobre mim; ela me faz pensar de uma maneira diferente. Diferente pois é um pensamento só meu, na medida que nunca ouvi alguém falando sobre chuva, então sinto como se essa reflexão em mim fosse pura. Tenho meu ponto de vista intocado pela opnião alheia, e essa certeza de individualidade e independência, até de egoismo, me faz feliz.

Queria mesmo ser uma gotinha de chuva. Eu poderia ser tanto, como parte da beleza imbatível de uma tempestade, ou de uma chuva ordinária qualquer. Eu apostaria corrida com outras gotas na janela de um carro em movimento. Eu deitaria em uma lágrima, se tivesse a sorte de molhar num rosto. Tentaria brindar amores, beijos, brincadeiras, perdas. Sentiria na queda somente a certeza de cair. Eu seria livre pelo sonho de um dia juntar-me ao mar. Poesia. Não tem nada mais poético que isso, e eu queria, pelo menos uma vez, que essa chuva fosse para mim.

9.1.11

Eu lírica

Porque tudo o que eu quero esquecer se apoia em mim, e o que eu preciso perder morde meus lábios num beijo. Posso sentir o gosto do sangue, que timidamente abraça minha língua, como antes brindávamos nosso amor.
Pois o que minhas mãos largaram, agora tapam meus olhos, censurando sua própria ausência. E qual outro motivo eu teria hoje? Meus porquês são nossos, mesmo livres de razão. Meus sentidos são abalados pelo anseio do perdão.

4.1.11

(S)em mim

Como eu me confundo em mim,
sem conseguir ser o que sou!

Como acordar numa gruta ,
é minha fugaz comoção
de não poder me explicar nem a mim,
ou entender meu porquê,
alcançar-me no fim.

Sigo apenas sabendo que existo sendo o que quer que exista em mim.