29.3.09

Longo caminho


É difícil lidar com uma doença, com certeza. É complicado assumir as abdicações necessárias ao tratamento. Todos sabem disso, mas ninguém pode saber como é a sensação. Mas como eu queria poder. Como seria melhor compreender cada pedaço dessa trajetória.
Ficaria mais fácil de acompanhar. Talvez não venha a servir de muita ajuda, mas simplesmente observar o trabalho do médico e do paciente em questão é o pior.
Uma vez li num texto da Lya Luft, uma frase que muito me marcou: " O mais difícil de ter um parente doente, é lembrar que é a ele que devemos dar atenção."
Quando alguém que amamos está mal, aparentemente nada que possamos fazer a respeito é suficiente.
Atualmente, um ente querido meu foi diagnosticado com depressão. Ao mesmo tempo que tomei conhecimento do estado de minha avó, quis desesperadamente que ela mesma viesse me falar que estava tudo bem. Mas ela, obviamente, nunca viria. Seria eu, quem deveria reconfortá-la. As tentativas para tal foram sempre frustradas, de modo que aos poucos, fui me distanciando. A minha amiga, minha companheira, já não estava lá. É como pensar no futuro, lembrando do passado, como se este pudesse voltar se eu insistisse em tratá-la como a velha vovó. Mas não tem como simplesmente fechar os olhos para o fato das brincadeiras, das conversas, agora serem motivo de choro para ela. Será que minha paciente pessoal ainda lembra de como éramos? Pergunto-me se, algum dia, terei ela de volta.
Ao mesmo tempo que esses pensamentos me assombram, sinto-me egoista por querer tanto uma coisa que deveria ser concentrada a ela. Afinal, ainda não a perdi. Posso abraçá-la sempre que quiser e tenho a esperança do meu lado. Mas, a cada dia que passa, eu me esqueço mais de como ela era. Vejo cartas, fotos e simplesmente não consigo rever a imagem de felicidade que sua companhia me passava.
E como essa falta dói.
Por isso, queria poder mergulhar nisso junto com ela; talvez ficássemos mais próximas. Talvez, ela se sentisse mais segura e eu mais eficiente. Talvez.
Não tenho chances, todos sabem. Basta-me agora continuar; rezando que ela saiba lá no fundo do amor que lhe tenho, que sempre terei, acima de qualquer coisa.

28.3.09

Toda hora é hora do Planeta!



No último sábado de março, dia 28, a partir das 20:00 horas, as luzes devem ser apagadas. Em nome da consciência ecológica, países do mundo todo estão promovendo campanhas para divulgação desse movimento que levará inclusive Paris, a cidade luz, a permanecer no escuro por uma hora e meia: a hora do Planeta.

É proposto um desafio para todos: passar uma hora e meia sem energia elétrica. Há aqueles que dizem ser muito pouco tempo, tendo em vista a necessidade de um racionamento em grande escala. E é de fato. Mas não penso ser possível um apagão voluntário desse porte, numa sociedade onde as atividades dependentes dessa energia reinam soberanas sobre um momento de conversa, um passeio ou até mesmo uma soneca.
Essa atitude pode ser prejudicial, mas não é de todo condenável. Nos adaptamos tanto ao ritmo frenético de informações intantâneas e coisas a fazer imediatamente, que uma hora longe dessa atmosfera pode nos valer mais do que imaginamos.

A mudança de hábitos cotidianos é alcançável. Com todo o trabalho dedicado aos jovens em prol do ecossistema, a nova geração é capaz de formar um novo modelo de vida. Não só apagando as luzes, mas usando a tecnologia, hoje em dia
tão dominada pela maioria, para métodos de racionamento. Seja como for, deve ser feito gradualmente,
de modo que todos saibam que esse bem é preciso, e não imposto.

Então que venha a Hora do Planeta! Vamos passá-la como se fosse um tempo, não perdido, mas gasto por uma boa causa. Afinal, na realidade, o Planeta ganhará pouco se comparado ao nosso próprio lucro.




19.3.09

HAIR



Falar de amizade, guerra e política. Ainda não tive a oportunidade de ver nenhum outro filme que relacionasse temas tão distintos com tamanha sensibilidade e, ao mesmo tempo, com um final arrebatador. A sociedade criticada da maneira mais fria possível. As feridas causadas pelos fatores políticos - e até religiosos - externos, impostos a cada um, desde seu nascimento.
A obra prima adaptada para o cinema por Millos Forman, aclamado diretor de "Um estranho no ninho", nos traz a verdade nua e crua, mas acima de tudo, vazia.

Temos Claude. Um típico americano, praticamente treinado para servir ao seu país e, quando chamado, morrer com uma bandeira na mão e com muito orgulho. E, no extremo oposto, temos George. Podemos descrevê-lo com apenas uma palavra: hippie. Isso já nos basta para saber o quanto os dois teriam assunto para debater.
Em todo caso, Claude e George se encontram no Central Park, na véspera da inscrição de Claude no exército. Eles sentem uma afeição mútua, e George tenta mostrar seu mundo livre, colorido e sem deveres civis ao mais novo amigo, a fim de convencê-lo a não partir para a guerra.
A história se desenrola num conflito contínuo de ideais e valores de diferentes lados da moeda. Dúvidas que valem para os dias de hoje; que nos fazem ver que não há certo ou errado, e sim, diferentes pontos de vista.

Dirigido de maneira genial e com uma trilha sonora perfeitamente projetada para cada cena do filme, Hair nos mostra a amizade vencendo barreiras que se encontram dentro de nós mesmos.
Já não interessa mais quem ou o que fez Claude e George seguirem tais caminhos.
Mas é precioso o cuidado com o qual cada um trata o outro. Simplesmente aceitam o que o amigo sonha, deseja e, de maneira ingênua, sem debates, respeitam.
Seria esse, enfim, o igrediente ideal para o mundo; a amizade sem ambições paralelas.

Mas o ideal encontra-se tão distante da realidade, que não sei se é possível haver tal sentimento em tempos de guerra. Chega sempre um momento em que devemos nos questionar qual personagem seremos; Claude ou George.
Seremos como cegos num tiroteio, completamente sozinhos por uma causa abandonada? Ou viveremos isolados em uma caixa escura longe de tudo que pode nos fazer bem, ou mal?
Não há uma resposta formulada para tais perguntas. Sendo todas desprovidas de segurança, que seja a consciência, o principal fator para a escolha.

17.3.09

Woody Allen





Reflexões, humor, charme e uma direção brilhante. Marcas clássicas de um de meus diretores e atores favoritos: Woody Allen.

Sendo em "Noivo neurótico, noiva nervosa" ou em "Manhattan", a estrela é sempre o acaso dos fatos combinados com um destino inesperado. Mudam a vida das personagens para pior e melhor na mesma medida, de modo que no final percebemos o quão belo é viver em todos seus altos e baixos.

O ponto de partida para a inspiração de Wood Allen provavelmente é a simplicidade das coisas, que pode ser complicada por mil sentimentos, mas, no final, tudo faz parte da vida.

É como se a idéia para um filme emocionante viesse à mente, ao sentar-se num banco do Central Park e observar os casais de mãos dadas, as crianças despreocupadas, os homens de negócio sempre ao telefone.

Seguindo esse exemplo, um dia sentei-me e observei por horas pessoas indo e vindo na pracinha perto da casa onde minha avó mora.

Senti-me tão bem, talvez pelo fato de estar numa atmosfera de mistérios, que provavelmente nunca teriam solução para mim. Como imaginar a história de cada uma daquelas pessoas, só reparando no jeito de vestir-se ou falar. Podemos conhecer tanto do superficial de alguém desconhecido, enquanto que nunca paramos para reparar em pequenos detalhes dos amigos íntimos.

Saí de lá com a convicção de que sabemos tanto uns dos outros quanto de nós mesmos; nunca o bastante. Mas em todo caso, de que adianta a busca desse conhecimento? Os professores de filosofia do mundo que me perdoem, mas sinceramente só quero deparar-me com certas respostas faltando pouco para minha morte. Como, por exemplo, "O que devo fazer da vida ?"

Responder a tal questionamento seria irracional, seguindo o ponto de vista defendido por Wood Allen em seus filmes, onde somos meros instrumentos do acaso. Como penas planando que se esbarram, ou não, mas nunca sabe-se ao certo onde vão parar.

Farei da minha vida aquilo que penso em realizar somente amanhã. Depois, terei tempo de bolar outra coisa. O futuro a longo prazo não me cabe. Apenas me preparo para ter um leque de opções vasto, afinal, é preciso estar preparada para o que vier. E que venha de tudo!




16.3.09

Like a Rolling Stone!


O conceito de música seria absurdo. Apenas por existir, ele já seria inaceitável. Ouvi uma vez um amigo dizer que falar sobre música é como dançar sobre arquitetura.

Que eu seja direta, então, já que não poderia faltar a poesia em sua mais bela forma, nesse Blog.

Cheguei a pensar um dia que a música, como todo tipo de arte, é uma maneira bonita ou não do artista imortalizar seus sentimentos. Podemos estar tristes ou não, satisfeitos ou não, que se conseguirmos transmitir o que está em nossa mente de maneira bela, tais sensações e pensamentos perderão forças. Quem me dera poder fazer uma música com a letra sincera e uma melodia condizente.

De muitas que admiro, quero falar de uma que, pode-se dizer, tornou-se uma fuga para mim. Um abrigo. Uma filosofia, talvez utópica, que me faz sentir mais segura comigo mesma. Foi feita por Bob Dylan, o que por si só já diz muito, e chama-se "Like a Rolling Stone".

Fala, penso eu, boa parte de seus ideiais com evidências de forte influência dos movimentos populares dos anos 60. Mas acima de tudo, fala da maneira de se encarar a vida. Um modo mais simples, mais independente, que me soa tão sedutor. Como se pudéssemos, através de um ideal próprio, mudar o mundo.

Se fechar os olhos e simplesmente escutar a letra, sente-se como que solto na sorte e no azar do próprio destino. Subordinado à própria vontade, hoje em dia tão negligenciada, e livre. Livre, planando simplesmente. Sem posses.

Parece-me tão sonhador. Soa um tanto Hippie demais, não? Mas acho belo.

Aqui vai um trecho, que traduz o que estou dizendo:


"Go to him now, he calls you, you can't refuse

When you got nothing,

you got nothing to lose

You're invisible now,

you got no secrets to conceal.

How does it feel

How does it feel

To be on your own

With no direction home

Like a complete unknown

Like a rolling stone?"


E diante do fato de me agradar muito a letra, me pergunto quanto ao verso que nos garante não perder nada, se não possuímos nada. Mas pense em apenas não possuir nada além de si mesmo. Em que espécie de egoísmo auto-suficiente eu estaria se nada possuisse, para livrar-me da dor de perder algo importante. Prefiro possuir mil coisas amadas, e, ao caso de perdê-las, poder dizer que um dia fui rainha delas, tive do que me orgulhar.

Mas essa sou eu. Para uns, como Bob Dylan, talvez, é possível sentir-se satisfeito apenas com palavras.

Quando me perguntarem qual a minha, basta dizer que estou disponível ao meu próprio acaso, mas sem nunca abandonar meus sonhos.

Afinal - fazendo algumas adaptações - "quando realmente se tem o que valorizar, estará em nós para sempre''.


CINEMA PARADISO


Noutro dia, passei pela rua perto da casa onde cresci. É uma rua pouco movimentada. Antigamente tinha árvores, que na primavera se enchiam de flores.
Encantava-me passar pela calçada enfeitada e olhar as casas. Eu morava em uma delas.
Quando passei por ela pela última vez, não havia flores no chão, e muitas casas, inclusive a minha, haviam sido derrubadas.
Senti uma nostalgia que não sei como descrever. Como se houvesse dois mundos dentro de mim: futuro e passado. O segundo sempre me parece mais sedutor.
Quando cheguei em casa, no mesmo dia, ainda me sentia saudosa, melancólica, lembrei-me muito de um filme em especial. Trata-se da primeira produção italiana que falarei aqui: Cinema Paradiso.
Com uma atmosfera simples, o grande vencedor do Oscar de 1990, conta a história de Totó, Alfredo, e acima de tudo, mostra a beleza da vida. Da paixão, da amizade, do amor e das coisas que sacrificamos pelo nosso futuro.
Resumindo, Totó aprende com Alfredo, na cabine do Cinema Paradiso, valores que ele levaria para sempre, junto com uma amizade inabalável. Ao ficar mais velho, depois de sofrer a primeira desilusão amorosa, Totó segue para Roma para tentar carreira. No dia de sua viagem, Alfredo pede a Totó que nunca retorne. Ele nunca deveria deixar a saudade atrapalhá-lo.
Então Alfredo diz minha fala favorita em todo o filme: "Temos que estar muito, muito tempo longe para que voltemos e encontremos novamente nossa terra... nosso povo."
Pergunto-me se é isso que acontece comigo. Se apenas quando estiver bem mais velha, mais vivida, voltarei à minha rua e verei novamente as flores pelo chão, as casas que um dia me pareceram tão familiares.
Acredito que isso venha a acontecer, como creio que, para isso, seja necessária uma mudança dentro de mim mesma. Mudança essa que só perceberei quando já tiver acontecido, que me fará sentir falta de quem eu era; chorar ao ver fotos antigas, sentir-me realmente velha ao olhar-me no espelho e, o mais importante, poder ter a certeza de que, lá no fundo, sempre guardarei o que foi mais marcante.
As pessoas que amo hoje, os lugares que me fazem sentir bem só de estar. Isso espero nunca deixar para trás. Perdemos tanto no caminho, que apenas percebemos o que fica, depois de nos acharmos realmente.
É o que julgo acontecer com Totó, ao voltar já um homem para a cidade onde crescera, e se deparar com fantasmas; os antigos amigos, os pequenos detalhes que a ele foram únicos... e o Cinema Paradiso.

14.3.09

O Leitor


Não vi o filme. Não pude ver a atuação de Kate e Ralph. No entanto, tenho certeza de que é um longa emocionante.
Acabei há pouco de ler o livro. Tão bem escrito: direto, cheio de reflexões convenientes, bem colocadas e discutidas.
Fiquei impressionada de ler um livro original com resquícios da Segunda Guerra e todo o drama do holocausto que ainda me provoca espantos.
Para mim, esse assunto em romances já não tem muita graça. Mas Bernhard Schlink retomou tal tema com uma abordagem que, pelo menos eu, jamais tinha visto ser empregada com tamanha sutileza.
A pergunta chave de toda a história: Como amar alguém que já fez parte de crimes que provocam horror?
Isso me faz pensar muito no porquê de se relacionar amor e pessoa amada. Por que pensar que amamos alguém por isso e aquilo, e , consequentemente, por que deixaríamos de amar depois de descobrir qualquer fato pecaminoso?
Não deixamos. De fato, só deixamos de amar alguém por nós mesmos; pelo tempo.
E foi isso que aconteceu com Michael. Ele foi, sua vida inteira, apaixonado pela mulher que ele conheceu e julgou aos 15 anos. Tanto amor, que mesmo depois de saber que a havia perdido, mesmo depois de superar a falta de seu toque, de sua presença, e depois de ter maturidade para analisar os atos de sua amada, o sentimento perdeu forças, mas nunca mais ele foi capaz de se sentir nos braços certos com mulher alguma.
O amor pode acontecer por motivos sensatos, ou não. Pode acontecer várias vezes ou nunca sequer existir. Renascer. Acabar sem explicações. Mas realmente não interessam os porquês.
Se não conhecemos algo, procuramos causas nobres. E se não houver?
Desde o princípio, as pessoas buscam conforto em fontes alheias, quando não conseguem nas que desejam de primeira. A busca faz parte, mas ao meu ver, nada pode superar a beleza de se ter um amor simplesmente, pois ele completa sua vida. Com defeitos e qualidades; completo.
Então que se torne fácil para todos amar de olhos fechados. Dessa maneira, estamos aceitando o sentimento mais lindo de todos em sua base. Todos sabem que ele é cego. Que sejamos com ele!

MIDNIGHT COWBOY


Acima de qualquer outro tema, "Perdidos na noite" - título no Brasil -, é um filme que se inspira nos sonhos.
Sonhos diferentes, de dois personagens que aparentemente nada têm em comum, até que se encontram por acaso, e, numa fuga da solidão, talvez, aprendem a amar e compreender um ao outro.
Joe Buck - típico texano, infeliz com sua vida de lavador de pratos, sonhador apaixonado por si mesmo, por suas imensas possibilidades de ser e viver coisas diferentes - resolve se aventurar na 'big apple'.
Com total convicção de que absolutamente nada poderia atrapalhar seus planos de ser um garoto de aluguel e, tão logo lá chegasse, teria madames ricas a seus pés e desfrutaria de uma vida que sequer jamais sentira perto de si. Sonhador.
Infelizmente as coisas não acontecem assim. Claro, nada poderia ser tão fácil. A vida nem sempre nos apresenta as chances que realmente queremos.
Joe tenta, fracassa, e depois de pouco tempo se vê perdido numa selva urbana, onde ele não passa de mais um, onde são indiferentes a ele. Seus ideais são, um a um, abandonados pelo simples fato de ser preciso.
No meio de uma crise, onde o 'cowboy' se pergunta onde perdera seu brilho, encontra Ricco. A princípio, ele aparenta ser o sujeito certo para tirar qualquer um do buraco. Ele domina toda a manha de se viver numa cidade grande, sem ter dinheiro para nada. Os dois começam uma amizade duvidosa, onde, após ser enganado por Ricco - que depois passa a ser chamado de Ratzo por implicância -, Joe não deseja manter laços afetivos.
Porém, os dois tornam-se amigos. Sim... o sonhador e o picareta. Joe descobre que Ratzo não passa de um coxo frustrado que nunca realizou coisa alguma, e Ricco conhece todo o medo de Joe. Medo de não ser aceito, o que ele julgava ser impossível, e por isso mesmo, levar constantes topadas.
Ricco era diferente. Ele nunca chegou a encontrar no espelho motivo algum de orgulho. Buscava em outros lugares: no fato de enganar os outros com facilidade e de sobreviver a quedas e no escuro. Mas isso nunca foi o suficiente. E a um certo ponto, ele abre mão de qualquer dignidade que ele poderia impor a si mesmo e literalmente pede a Joe que o faça companhia. Apenas isso. E a convivência os fazem íntimos.
A amizade, o afeto e o carinho entre eles talvez não ocorressem de modo algum, se não estivessem, como dizem, na hora certa e no lugar certo. O ponto de partida dessa relação, no final das contas, é a solidão. Esse sentimento que torna-se tão difícil de se aceitar com o tempo, fez nascer algo belo.
Sentimentos reais podem nascer onde só haveria falsidade. O grande engano de se achar que tudo que temos de valor, estávamos procurando o tempo todo. Nenhum dos dois estava.
Vejo-os como vejo a mim mesma e a muitos de meus amigos. Como cães que perseguem um caminhão, a toda hora, com grande determinação. Mas, no entanto, não saberiam o que fazer se o alcançassem. Não saberiam o que fazer e nem sequer sabem se é realmente esse caminhão que querem. Mas é ele que se apresenta impossível. Na corrida, ganhamos e perdemos muito. Sofremos e sorrimos; mudamos. Até que o caminhão não parece grande coisa. Correr não é mais valioso; sentamos.
Passamos a observar a corrida de outros, como se olhássemos para o próprio passado.
...
Não é possível saber o que acontecerá com os dois 'perdidos' até que realmente chegue a cena final. Mas é fácil perceber o quanto um ajudou o outro, da maneira que nunca pensaram precisar, apenas representando um abrigo.

JULES ET JIM




Segue com um ritmo quase cronológico. Rápido e sem muitos detalhes no início, o filme começa mostrando como a amizade de Jules e Jim cresceu. Como era a relação. Define o perfil dos dois amigos. Tudo muito rápido, como a juventude. Como os desejos de cada um, talvez.
Mas o rumo das coisas muda depois de Jules conhecer, e apresentar, Catherine a Jim. Daí começa um triângulo amoroso recheado de sentimentos, ações e dúvidas tão reais e humanas, que é impossível não se sentir em conflito com as personagens.

Ao decorrer, escolhas são feitas e o ritmo não é tão alucinado. Vem a guerra, a perda. Sem percebermos a fase de transição , tudo está quieto, como se não houvesse mais curiosidade pelo futuro. Como se a paixão não estivesse presente para mover desejo algum. Até que, mais uma vez, surge o amor. Com ele parece que tudo se torna novo e interessante. Mas a realidade dificilmente condiz. Em todos os termos, quando sentimos que algo está novo, completamente novo, após anos de entorpecimento, é comum uma queda. Mas pior que ela, sentimos como se , na verdade, nunca tivessemos saído do buraco.

Quando tudo é realmente uma descoberta, sentimos o gosto das perdas com uma sensação quase saudável de que teremos tempo para uma segunda chance. Mas mesmo quando recuperamos, sentimos que o tempo é exatamente o que nunca possuímos.
E uma nova recaída pode ser fatal. Será por isso que nos confortamos em nós mesmos, em memórias, em desculpas que ninguém acredita?
Medo. Indefinível e silencioso. Vem com o tempo, vem facilmente... sem vontade alguma e ainda assim, tão forte.

E é esse medo que Truffaut, de maneira suave e desprovida de diálogos desnecessários, adiciona à personalidade de suas personagens, que, no final, nos mostram como podemos mudar e ainda sermos os mesmos. Não se explica, mas é visível em cada olhar. Deixamo-nos moldar, de maneira que só depois de muito tempo, percebemos que aquilo que estava dentro, que era o mais importante, nunca sequer foi tocado.